São boas notícias. O ministro da Economia, Abrahão Gourgel, prevê que graças ao investimento (do Governo, obviamente) na produção de ovos, o país poderá alcançar a auto-suficiência no primeiro trimestre de 2017. Por nós, pela sua larga experiência e competência na matéria, a gestão deste assinto deveria ser entregue a… Isabel dos Santos.
Por Orlando Castro
Em declarações à imprensa, o ministro afirmou que actualmente são produzidos 1.500.000 ovos por dia, salientando que o Estado tem estado a financiar empresas certificadas neste ramo, através do Programa Angola Investe.
Em relação à produção de frangos, o ministro admitiu haver alguns constrangimentos em equipamentos e financiamentos com os quais se debatem os empresários.
“O Executivo vai solucionar tal situação dentro de pouco tempo, aferindo ser também pretensão do Governo atingir a auto-suficiência na produção de francos”, referiu.
Segundo Abrahão Gourgel, o Estado, através do Ministério da Economia, está a priorizar as empresas que pretendem contribuírem na produção de ovos e de frangos.
Durante a estada na região do Cuito, o ministro da Economia inteirou-se do andamento das obras da fábrica de água mineral, de uma serração, da estação de serviço “Faztudo”, do complexo hoteleiro da “AGP”, Safri Metal e a construção de um instituto médio politécnico.
No tempo colonial
Por mera curiosidade registe-se que, enquanto província ultramarina de Portugal, até 1973, Angola era auto-suficiente, face à diversificação da economia.
Era o segundo produtor mundial de café Arábico; primeiro produtor mundial de bananas, através da província de Benguela, nos municípios da Ganda, Cubal, Cavaco e Tchongoroy. Só nesta região produzia-se tanta banana que alimentou, designadamente a Bélgica, Espanha e a Metrópole (Portugal) para além das colónias da época Cabo-Verde, Moçambique, Guiné-Bissau e Sã Tomé e Príncipe.
Era igualmente o primeiro produtor africano de arroz através das regiões do (Luso) Moxico, Cacolo Manaquimbundo na Lunda Sul, Kanzar no Nordeste Lunda Norte e Bié.
Ainda no Leste, nas localidades de Luaco, Malude e Kossa, a “Diamang” (Companhia de Diamantes de Angola) tinha mais 80 mil cabeças de gado, desde bovino, suíno, lanígero e caprino, com uma abundante produção de ovos, leite, queijo e manteiga.
Na região da Baixa de Kassangue, havia a maior zona de produção de algodão, com a fábrica da Cotonang, que transformava o algodão, para além de produzir, óleo de soja, sabão e bagaço.
Na região de Moçâmedes, nas localidades do Tombwa, Lucira e Bentiaba, havia grandes extensões de salga de peixe onde se produzia, também enormes quantidades de “farinha de peixe”, exportada para a China e o Japão.
Diversificar as… galinhas
Quando, em Fevereiro de 2014, o ministro da Economia, Abrahão Gourgel, inaugurou em Luanda a primeira fábrica de alimentos compostos para animais, na fazenda Pérola do Kikuxi, ficou a saber-se que que iria aumentar substancialmente a produção de ovos em Angola.
Finalmente, pensou-se, o país compreendeu que a mulher mais rica de África, a multimilionária Isabel dos Santos, tinha razão quando, ainda criança, começou a vender ovos nas ruas de Luanda.
Assim, na altura, a aposta sai reforçada com a promessa, já então velhinha, de que era urgente diversificar a economia. Assim, a Angolaves queria voltar a ser líder na produção de ovos, numa altura em que intensificava a produção de milho, bagaço de soja, farinha de peixe, ração e pintos e tinha um aviário que albergava 15 naves onde se encontravam cerca de 336 mil aves.
Há quem diga que, afinal, Isabel dos Santos (a princesa do clã de sua majestade o rei José Eduardo dos Santos) teve e tem um sucesso estrondoso não pelos ovos mas pela proximidade em relação ao poder, sobretudo no que diz respeito ao acesso aos negócios. Más línguas. Aliás, a escolha para PCA da Sonangol, pelo seu pai, é prova disso…
“O que explica Isabel dos Santos, assim como outras entidades, não só em Angola, é a proximidade do poder para os negócios. Não são precisos meios obscuros, basta o acesso aos negócios”, afirmou em 2015 Filipe S. Fernandes, autor do livro “Isabel dos Santos — Segredos e poder do dinheiro”.
Para Filipe Fernandes, normalmente associa-se a fortuna de Isabel dos Santos aos diamantes que o pai lhe teria dado, mas “há uma hipótese muito mais simples” que pode explicar a fortuna como, por exemplo, a concessão das telecomunicações (UNITEL) nos anos 1990. Isto já para não falar dos ovos.
Na altura, Angola estava a tentar que houvesse uma empresa internacional a concorrer à licença de concessão de telemóveis e em plena guerra civil ninguém queria arriscar e, “de certo modo”, explica o autor, o negócio teria de ser dado a alguém que tinha de estar próximo do poder. E quem melhor do que a filha do Presidente?
“Só o facto de ter tido aquela concessão pode ter sido uma boa base para uma boa fortuna e basta ver o valor dos dividendos que são pagos pela UNITEL desde que foi criada sendo que teve dividendos desde muito cedo”, explicou.
Regressemos a Fevereiro de 2014. “São projectos como estes que permitem impulsionar a nossa economia e melhorar os níveis de produção interna, reduzindo as importações”, referiu o ministro Abrahão Gourge que, por lapso, se esqueceu também de referir que este sinal de progresso se deve ao espírito estratégico e inovador de sua majestade o rei José Eduardo dos Santos.
Na mesma ocasião, o consultor do ministro da Economia, Licínio Vaz Contreiras, disse que o programa “Angola Investe” previa atingir 70% das necessidades do mercado em ovos até final do ano (2014). Provavelmente com algumas modificações genéticas as galinhas produziriam ovos com as diferentes marcas comerciais e, quem sabe, até com as cores do proprietário ou do Governo.
“Em 2012, quando visitámos a fazenda Pérola do Kikuxi, existiam apenas 25 mil galinhas em crescimento, hoje 200 mil galinhas geram um ovo por dia”, afirmou Licínio Vaz Contreiras, descobrindo – o que importa realçar – um verdadeiro ovo de Colombo.
E acrescentou que “esta unidade fabril começa a resolver a cadeia de produção de ovos e frangos, que para nós constitui um grande impulso ao sector aviário”. Talvez assim, nas zonas mais inóspitas, possamos ver as jovens de cesto na mão a vender os ovos nas picadas, procurando um dia serem também milionárias.
A santa dos milagres paternais
Certamente que agora, perante a crise que até levou o reino a pedir um diagnóstico ao Fundo Monetário Internacional, o Executivo não deixará de implementar o lançamento de ovos da marca “Isabel dos Santos”, destinados à exportação, correspondendo, aliás, à emblemática tese da filha de sua majestade o rei que diz: “Tive sentido para os negócios desde muito nova. Vendia ovos quando tinha seis anos”.
Isabel dos Santos, a mulher mais rica de África, é já um património da humanidade, sobretudo a nível da transparência empresarial e da valorização de um produto quase autóctone – o ovo. Não são produzidos pelas chamadas galinhas de Angola mas de um seu parente, o que para o efeito é irrelevante.
Além disso, como se sabe, a ascensão empresarial da Santa Isabel dos Ovos não se deveu, longe disso, ao facto de ser filha do dono do aviário, mas tão-somente à sua capacidade genética para antecipar os bons negócios, dos quais a venda de ovos foi um talismã.
Acresce que todas as afirmações de Isabel dos Santos, ovíparas ou não, constituem um legado da humanidade. Vejamos algumas que fez ao influente jornal britânico Financial Times:
“Lembro-me quando existiam 300 mil carros em Luanda, quando existiam 600 mil carros, quando existia um milhão de carros e agora penso que existem 2 milhões de carros. Está relacionado com o crescimento do mercado de consumo. Apenas cresceu de forma muito mais rápido do que as infra-estruturas podiam acompanhar”;
“Como se consegue baixar a desigualdade em Angola? Criando oportunidades e criando cada vez mais desenvolvimento. Acordar de manhã e ir trabalhar, fazer alguma coisa. Vai demorar muito tempo, mas quanto mais coisas se fizer acontecer, mais coisas serão construídas”;
“Duvido [que os meus pais tenham sido apresentados pela KGB, quando se conheceram na antiga União Soviética]. Demoraram sete anos a casar, a obter as autorizações. Não penso que tenha sido o KGB, pois nesse caso teriam obtido os papéis mais cedo”;
“O meu pai gosta de cozinhar. Gosta de Peixe. Nunca tivemos o sentido da grandiosidade. Eu ia a pé para a escola”;
“Imagino que seja muito difícil distinguir o pai da filha. Penso que essa dificuldade advenha de estar a fazer as minhas coisas e o meu pai ser uma figura política africana muito forte há tantos anos”;
“Os meus pais foram muito exigentes comigo. Tinha cerca de 23 horas de aulas por semana, mais os laboratórios, mais os relatórios, pelo que não havia tempo para divertimentos”;
“Há muitas pessoas com ligações familiares, mas que hoje não são ninguém. Se for trabalhador e determinado vai ter sucesso e isso é o principal. Não acredito em caminhos fáceis”;
“Não estou envolvida na política e nunca tive qualquer papel na política. Nunca tive um emprego na administração pública. Não trabalho com o Governo”;
“Estou sempre a trabalhar, sete dias por semana. O trabalho é divertido. Se faz alguma coisa que vai dar um emprego a alguém, e essa pessoa depois pode pagar a educação do seu filho, e depois o seu filho vai ser um médico, que provavelmente ajudará muitas outras pessoas, isso é muito motivante. Muito mais divertido do que ir para a praia”.